Por Sandro Oliveira
Aqui vai um texto um pouco longo, mas se você curte uma boa leitura, espero que goste. No Dia de Finados, é comum reencontrar pessoas que não víamos há muito tempo — não são os que partiram, mas os que ainda estão vivos. Essas pessoas que voltam para acender uma vela no túmulo de um ente querido eram anteriormente afastadas. Isso leva à reflexão de que, apesar da dor, a morte consegue unir as famílias.
Os funerais são ocasiões em que muitas famílias se reúnem. Cada um busca melhorar sua vida e acaba se mudando para lugares diferentes, às vezes bem distantes. Anos podem passar sem a troca de visitas, chamadas telefônicas ou qualquer sinal de contato. Novas amizades surgem e, gradualmente, os antigos laços vão se desfazendo. Porém, quando um membro da família falecem, tudo muda. Surge a urgência de notificar parentes distantes.
Aqueles que estavam ausentes e não deram notícias por muito tempo, ao saber da perda, frequentemente respondem: “Esperem por mim, não enterrem até que eu chegue”. É interessante notar esse comportamento, que demonstra como a morte pode trazer de volta pessoas que a rotina não conseguiu manter unidas. É curioso observar o ser humano nessa situação. Passam-se anos sem preocupação com a família, mas quando ocorre a morte de um familiar, tudo é interrompido para comparecer ao sepultamento. Até aqui, essa atitude pode ser vista como compreensível diante da perda. Mas os outros presentes, os "convidados do enterro", se veem obrigados a esperar pela chegada desse parente que vem de longe para se despedir do pai, da mãe ou do irmão no caixão.
Além disso, ele ainda solicita que a cerimônia aguarde sua chegada. Esse cenário sugere que a morte tem a capacidade de reunir pessoas que a vida cotidiana não conseguiu manter próximas. Existe um contraste notável entre anos de afastamento e a súbita presença provocada pelo luto. Isso revela as complexidades em como lidamos com nossas famílias e com a perda de pessoas queridas.
Finalmente, após um longo atraso de quase três horas após o horário combinado para o funeral, o indivíduo finalmente chega ao velório. Ele aparece sério, usando óculos escuros, e cumprimenta os presentes com um simples aceno. A sua expressão carrega o peso da perda e, momento a momento, ele se dirige ao falecido. Ao lado do corpo, permanece em silêncio por alguns instantes, suspira e então se junta a parentes e amigos, recebendo as tradicionais condolências. A sua atuação mescla dor e formalidade. A sua chegada atrasada contrasta com a espera dos outros, chamando atenção. Nele, se observa um ritual de luto sendo seguido, com momentos de silêncio ao lado do corpo e as palavras de consolo recebidas.
Enquanto isso, do lado de fora, vizinhos e amigos fazem a típica conversa de velório, repetindo as mesmas frases de sempre. Algumas expressões comuns incluem: “Parece que está dormindo”; “Nossa, tão jovem!”; “Era uma pessoa tão boa, sempre cuidava da família e muito envolvida com a Igreja...” Essas conversas funcionam quase como um ritual, onde as pessoas buscam lembrar as qualidades do falecido e demonstrar sua saudade, tentando capturar a essência da pessoa que se foi.
Caro leitor, você pode estar rindo enquanto lê isso e concordando, mas é exatamente assim que ocorre. Depois, vemos aquele mesmo indivíduo, que veio de longe, sair do velório sorrindo e alegre, com os óculos escuros — se for mulher, coloca os óculos na altura da cabeça, entre os cabelos; se for homem, já sai conversando sobre esportes, carros, contando piadas... E todos riem como se nada tivesse acontecido. O falecido foi quase esquecido e não era lembrado em vida. Agora, a tendência é que seja ainda mais rapidamente esquecido; caso haja herança, talvez seja lembrado por alguns dias a mais.
A ironia está no contraste entre a seriedade mostrada no velório e a repentina mudança de humor que ocorre depois. Concluo esse longo texto fazendo um convite à reflexão sobre seus relacionamentos familiares: Como estão suas relações com a família? Você tem dedicado tempo de qualidade a eles? Preocupa-se genuinamente com o bem-estar dos seus familiares? Quais ações concretas você tem tomado para fortalecer esses laços e viver melhor com sua família? Somente se lembra deles em momentos de perda, como na morte de alguém? Tomo um momento para que você pense sobre essas questões.
Sandro Oliveira
Membro do Movimento de Cursilhos







